foto: Ivan Abujamra
Em seu ateliê em Nova York, em 1958, o já consagrado artista Mark
Rothko recebe pela primeira vez seu novo assistente, Ken. “O que você
vê?”, pergunta, apontando para uma das pinturas em que trabalhava. A
partir daí, uma bela relação desenvolve-se diante da platéia; um
encontro cheio de nuances, em que ambos se permitem indagar e refletir,
questionar e ouvir. É esse o ponto de partida do espetáculo Vermelho,
dirigido por Jorge Takla, e estrelado por Antonio Fagundes, como Rothko,
ao lado de seu filho Bruno Fagundes, que interpreta o jovem aspirante a
artista.
Premiadíssimo na Broadway (seis Tonys, na temporada 2010), Vermelho é
uma co-produção de Antonio Fagundes e Jorge Takla.
Escrita pelo dramaturgo e roteirista John Logan, e traduzida por
Rachel Ripani, com figurinos de Fabio Namatame, o espetáculo se passa no
período entre 1958-1959, quando o pintor russo, naturalizado
norte-americano, – que ganhou notoriedade ao encabeçar o Expressionismo
Abstrato -, trabalha em uma série de murais para o sofisticado
restaurante Four Seasons, no Edifício Seagram, na Park Avenue,
encomendados a ele por uma quantia recorde à época.
Vermelho é um olhar carinhoso sobre um grande artista consagrado
passando o bastão para uma nova geração de novos artistas inquietos,
provocadores e talentosos. O espetáculo é também um panorama da arte moderna da
Nova Iorque dos anos 50, quando mestres consagrados como Rothko, de
Kooning e Pollock conviviam com artistas jovens e arrogantes (que não
eram levados a sério) como Andy Warhol e Liechtenstein.
Um dos pontos primordiais do texto é a sua universalidade, como
aponta o diretor Jorge Takla:
Enquanto acompanhamos o processo de
criação desse grande artista, percebemos um conflito comum a todos nós,
criadores: o dilema entre o artístico e o comercial. A relação que
existe no palco entre Rothko e Ken observa, de forma carinhosa, a troca
entre um artista consagrado que passa o bastão a uma nova geração
provocadora que está por vir. Vermelho é uma obra exigente que, como
Rothko, nos leva a criar um clima de luzes delicadas, um ambiente suave
para valorizar as obras e deixá-las pulsantes e vivas. Aliás, a luz foi
um dos desafios da montagem, pois Rothko dizia que uma obra vive por
simbiose, ela precisa do olhar empático do observador, e por isso ele
tinha que protegê-la, controlando a luz, a altura em que ela está
exposta, a distância do observador; senão a obra poderia morrer
desprotegida.”
O texto vai muito além de uma biografia de Rothko. Se deixarmos o
artista falar de sua necessidade de comunicação com a platéia e de sua
vontade de descobrir a pureza de sua arte, conseguimos ampliar o alcance
do texto mais do que se nos limitássemos a imitar o Rothko, comenta
Fagundes. Bruno completa: É interessante como as discussões podem ser
lidas de vários pontos de vista, e tocam em outros âmbitos; é uma troca
constante e quase inevitável, como se fosse uma necessidade deles, e
isso vai revelando as diversas camadas dos personagens aos poucos.
A troca de conhecimentos, no entanto, não se dá apenas na ficção.
Pela primeira vez, Antonio Fagundes contracena com seu filho, Bruno. No
palco, os atores mostram, também, a intimidade construída no processo de
criação de um artista. Preparam e misturam a tinta, esticam a tela,
debatem a iluminação ideal para, nas palavras do artista, proteger sua
obra de arte. Com muita segurança, Rothko conduz Ken - e a plateia - por
um caminho teórico cheio de referências e, ao mesmo tempo, extremamente
sensível.
Sobre o artista Mark Rothko
Nascido no ano de 1903, em Dvinsk, na Rússia, Mark Rothko
transferiu-se com sua família para Portland, nos Estados Unidos, com
apenas dez anos. Apesar de sua má condição financeira, recebeu ótima
educação, ingressando na seleta e tradicional Universidade de Yale, em
1921, e vislumbrando uma carreira política que contivesse seu grande
engajamento social. No entanto, dois anos depois abandonou os estudos e
partiu para um rumo menos acadêmico, estabelecendo-se em Nova York, em
1925, quando começou a pintar de forma autodidata.
Mais tarde, estudou a técnica, sob a tutela do artista Max Weber,
partindo de um estilo realista – como sua série Subways, de 1930 -, para
gradualmente desenvolver seu estilo, passeando pelas formas abstratas
da década de 1940, até chegar em figuras abstratas que enfatizavam a cor
e a forma. Nos anos 1950, distanciou-se do Surrealismo para se tornar
um dos principais artistas do Expressionismo Abstrato, ao lado
de Jackson Pollock e Willem de Kooning. Sempre com a preocupação de
comunicar e de produzir emoção por meio de suas grandes telas, Rothko
evoluiu seu estilo ao simplificá-lo – priorizando a cor e as
sobreposições, desenvolveu em sua obra a noção de “campos de cor”,
bastante característica daquele momento.
Mesmo tendo abandonado os estudos na Universidade, Rothko considerava
fundamental o conhecimento formal: foi profundo conhecedor de filosofia
e arte, sendo muito influenciado pela obra de Friedrich Nietzsche. No
período entre 1958-59, retratado no espetáculo Vermelho, Rothko
trabalhava na série de murais Seagram, obra encomendada para o
sofisticado restaurante Four Seasons, em Nova York.
A crise vivida por
ele naquele momento culminou na desistência e devolução do dinheiro
adiantado pelo trabalho, que hoje encontra-se exposto na Tate Modern, em
Londres, na National Gallery of Art, em Washington, e no Kawamura
Memorial Museum, no Japão. Além de muito influente como artista, Rothko
dedicou-se por décadas ao ensino da arte, lecionando em diversas
instituições. Ele suicidou-se em 1970, em Nova York.
Sobre o dramaturgo John Logan
John Logan iniciou sua carreira de dramaturgo em 1985, quando
escreveu sua primeira peça, Never the Sinner, em sua cidade natal
Chicago (EUA); cinco anos depois, ela foi montada no West End londrino
e, em 1998, em Nova York. Após escrever outros textos para o teatro,
como Hauptmann e Riverview, um melodrama musical, migrou para o roteiro
audiovisual em 1996.
Com uma carreira muito bem-sucedida no cinema, foi responsável por
roteiros de filmes como: Um Domingo Qualquer, dirigido por Oliver Stone, O
Gladiador, de Ridley Scott, O Último Samurai, de Edward Zwick, Sweeney
Todd, de Tim Burton, e O Aviador, de Martin Scorsese, parceria que se
repetiu com A Invenção de Hugo Cabret, que lhe rendeu sua terceira
indicação ao Oscar de melhor roteiro. Em Londres para as filmagens de
Sweeney Todd, do qual foi também produtor, conheceu os famosos murais
Seagram, de Mark Rothko.
Fascinado pela pequena explicação que acompanhava as obras, pesquisou
por um ano a vida, as referências e o legado de Mark Rothko. Foi assim
que voltou às suas origens no teatro e criou Vermelho, estreando em
dezembro de 2009 no teatro The Donmar Warehouse, em Londres, com Alfred
Molina no papel de Mark Rothko e Eddie Redmayne, como Ken. Em março de
2010, a peça foi montada com o mesmo elenco na Broadway, em Nova York,
com maravilhosa repercussão, ganhando cinco prêmios Tony, inclusive o de
melhor espetáculo. Talentoso e versátil, Logan escreveu, recentemente, o
roteiro do longa-metragem da série 007, Skyfall, dirigido por Sam Mendes.
Espetáculo altamente recomendado
por Intervalo Cultural - RJ
Serviço
Vermelho
Local: Teatro Sesc Ginástico
Temporada: até 16/6, de quinta a domingo
Horários: sempre às 19h
Ingressos: Quinta, sexta e domingo: R$ 5 (associados); R$ 15 (estudantes e idosos) e R$ 30 (os demais). Sábado: R$ 5 (associados); R$ 20 (estudantes e idosos) e R$ 40 (os demais).
Duração: 80 minutos
Classificação: 12 anos
fonte: Omint
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